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Racismo religioso é tema de roda de conversa em terreiro na Baixada Fluminense (RJ)

Rio de Janeiro – Dando seguimento ao “Rodas de Conversas nos Terreiros”, praticantes de religiões de matriz africana e autoridades públicas se reuniram na última sexta-feira (24) no Terreiro Ilê Omolu Oxum, da Mãe Meninazinha de Oxum, em São João de Meriti (RJ). O evento foi organizado em parceria pela Defensoria Pública da União (DPU) e pelo 4° Núcleo Regional de Tutela Coletiva da Defensoria Pública do Estado do Rio de Janeiro (DPE/RJ). Esse foi o segundo encontro do projeto, que busca promover políticas públicas voltadas para o combate ao racismo religioso.

Dirigente do terreiro em São João de Meriti, Mãe Meninazinha de Oxum.Através da conversa com o povo de axé, a Defensoria propõe a sensibilização das autoridades públicas sobre as principais dificuldades enfrentadas e as demandas mais urgentes no tema. O objetivo é fortalecer as comunidades de terreiros, preservar as tradições religiosas de matriz africana e enfrentar o racismo religioso. A primeira roda de conversa aconteceu no Centro Espírita Omulu Pai João e Malandrinho, em Belford Roxo (RJ), na terça-feira (21), e a ideia é que novas conversas sejam marcadas em outros terreiros da região metropolitana do Rio de Janeiro, estado que mais concentrou registros de intolerância religiosa no último ano.

A dirigente do terreiro em São João de Meriti, Mãe Meninazinha de Oxum, abriu o evento registrando sua alegria com a oportunidade de valorizar as manifestações culturais afro-brasileiras. “É muita felicidade estarmos todos aqui juntos falando sobre as nossas coisas, nossa moda, nossa religião e nossos orixás. Esse calor e essa união são maravilhosos, para mim, isso é família”.Defensora pública federal Natalia Von Rondow

Segundo a defensora pública federal Natalia Von Rondow, coordenadora do Grupo de Trabalho de Políticas Etnorraciais (GTPE) da DPU, “é de grande importância estarmos aqui hoje para celebrar e comemorar, mas antes de mais nada também para cobrar e buscar políticas públicas no combate ao racismo e na luta pelo respeito às religiões de matriz africana. Por isso, escolhemos ir além de apenas reagir às denúncias e buscamos construir uma pauta afirmativa e proativa em conjunto com nossos parceiros”.

O encontro no Terreiro Ilê Omolu Oxum contou com a presença do professor Hedio Silva Junior, advogado das Religiões Afro-brasileiras no Supremo Tribunal Federal (STF) e coordenador do Instituto de Defesa dos Direitos das Religiões Afro-brasileiras (Idafro). De acordo com ele, “estudando o fenômeno da intolerância religiosa podemos constatar que o discurso de ódio atinge vários segmentos, como os judeus, os mulçumanos e até mesmo os ateus. No entanto, nenhuma religião enfrenta uma perseguição tão sistemática e que se estende do plano da religiosidade para todo o legado civilizatório, como a de matriz africana”.

Professor Hedio Silva JuniorSilva Junior destaca ainda que, “tudo aquilo que foi legado do tráfico transatlântico, que trouxe para o Brasil cinco milhões de seres humanos durante três séculos e meio, ingressa numa fórmula discursiva em que se usa da expressão gospel, que quer dizer letra de Deus ou evangelho, como antítese e como contraposição para tudo aquilo que é considerado do demônio, como a transformação do acarajé em bolinho de jesus”.

Para o professor, “se a África é um continente amaldiçoado, tudo aquilo que está associado a ela é demonizado e deve ser contraditado com o evangelho. Isso é um discurso de ódio, nas suas mais perversas e artroses formas de manutenção. Por isso entendo que intolerância religiosa não dá conta do que se vê no Brasil, porque não se trata apenas de um descenso, não é apenas uma crítica, mas sim um ataque sistemático a tudo que diz respeito a presença negra e africana na nossa cultura”.

Cerca de 75 pessoas estiveram presentes a Roda de Conversa, dentre as quais a defensora pública estadual, Thaís Lima; a deputada estadual, Renata Souza; o procurador da República, Julio Araújo; o diretor do Museu da República, Mário de Souza Chagas; e o secretário de Direitos Humanos e Igualdade Racial de São João de Meriti, Marcelo Rosa; além de lideranças religiosas locais e representantes de organizações da sociedade civil que atuam no tema.

Ao final do evento, foram feitos encaminhamentos institucionais para o enfrentamento ao racismo religioso e assinados dois documentos, um de autoria da DPE/RJ e outro do Museu da República, ambos no sentido de avançar com uma agenda comum e de atuação permanente no combate ao preconceito e à intolerância.

Exposição “Respeite o meu terreiro”

Além da Roda de Conversa, o Terreiro Ilê Omolu Oxum também recebeu durante a Semana de Conscientização do Combate ao Racismo Religioso a mostra fotográfica “Respeite o meu terreiro”, no espaço Museu Memorial Iyá Davida. A exposição, com curadoria de Marco Antonio Teobaldo, conta com 66 fotografias de Alex Ferro que retratam o cotidiano de um terreiro de candomblé e está disponível na plataforma Google Arts.

Para o evento, algumas fotos com imagens dos sacerdotes mais velhos do terreiro e com cenas do dia a dia das atividades que normalmente não são conhecidas pelo público em geral foram impressas e expostas em grande escala para homenagear todas as religiões de matriz africana.

GT Políticas Etnorraciais

A DPU possui um grupo permanente voltado ao enfrentamento do racismo e à valorização e resgate da história e cultura da população negra. As atividades do Grupo de Trabalho de Políticas Etnorraciais (GTPE-DPU) são voltadas à promoção da defesa dos direitos étnicos individuais, coletivos e difusos; ao fomento à efetivação da igualdade de oportunidades e o enfrentamento ao racismo e à discriminação, com o monitoramento de casos sensíveis à pauta; bem como ao fomento à criação e adoção de medidas, programas e políticas de ação afirmativa.

No combate à discriminação e ao racismo religioso, o GTPE-DPU promove ações, como o projeto “Rodas de Conversas nos Terreiros”, e em 2022 iniciou o projeto “A Defensoria Pública da União no combate ao racismo religioso”. A campanha “Interfaces do Racismo”, lançada pelo GT em 2018, conta com um minidocumentário sobre o racismo religioso. O episódio apresenta depoimentos sobre o processo histórico e político de violência sofrida por praticantes de religiões de matriz africana, e sobre os mecanismos de atuação do racismo religioso.

 

 

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Assessoria de Comunicação Social
Defensoria Pública da União