DPU – Direitos Humanos

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DPU propõe acordo para resolver o caso do acampamento Zé Maria Tomé (CE)

Fortaleza – Nesta última terça-feira (11) a Defensoria Pública da União (DPU) realizou nova reunião para tratar do acordo que irá solucionar a situação do acampamento Zé Maria Tomé, localizado no perímetro irrigado Jaguaribe-Apodi, na Chapada do Apodi, interior do Ceará. No encontro, a DPU apresentou minuta de proposta concreta para a conciliação, que será submetida à avaliação da Comissão de Conflitos Fundiários (CCF) do Tribunal Regional da 5ª Região (TRF5) e encaminhada ao Departamento Nacional de Obras Contra Secas (DNOCS) e ao Ministério Público Federal (MPF).

Participaram da reunião representantes do Movimento dos Trabalhadores sem Terra (MST), do Instituto do Desenvolvimento Agrário do Ceará (Idace), da Cáritas Diocesana do Ceará, da Casa Civil do Governo do Estado do Ceará, da Procuradoria Geral do Estado do Ceará (PGE/CE), do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) e da Universidade Estadual do Ceará (UECE). Representou a DPU a defensora regional de direitos humanos no Ceará, Lídia Ribeiro Nóbrega.

Proposta de acordo

Os presentes puderam ler o texto e se manifestaram acerca da proposta, centrada em assegurar o direito à permanência digna das famílias acampadas na região, sugerindo mudanças e realizando comentários sobre os pontos apresentados. O texto foi fechado e será encaminhado nesta quinta-feira (13) ao juiz federal João Luís Nogueira Martins, responsável pela CCF no Ceará. O acordo também será apresentado ao DNOCS pelo Incra em reunião, no dia 18, que irá analisar a proposta.

O acordo pretende finalizar o conflito e realizar a implantação de projeto de agricultura familiar irrigada, com modelo de gestão para ocupação e regularização fundiária da área, com a desapropriação das áreas ainda pendentes e respeitando a faixa de 50 metros contígua ao canal de irrigação. Se aceito, o documento também delimitará as responsabilidades de todos os envolvidos para a devida implantação do projeto.

Os ocupantes deverão criar associação ou cooperativa e serão responsáveis pelos aspectos produtivos da terra, como a distribuição das áreas de moradia e plantio, seleção de famílias, escoamento de produção, entre outros. O MST deverá auxiliar na implantação da infraestrutura necessária e a liberação de todas as áreas que estejam ocupadas pelo Zé Maria Tomé que não coincidam com a área destinada ao projeto de agricultura familiar, além de assegurar a contemplação das famílias que atualmente já se encontram assentadas e produzindo na área do acampamento.

O DNOCS será responsável pela construção da infraestrutura necessária para regulação do abastecimento de água do projeto e as fiscalizações e serviços de manutenção das áreas comuns do perímetro público irrigado. O Idace realizará o georreferenciamento completo da área e o cadastramento das famílias que já estão assentadas e o Incra viabilizará a entrada do projeto nos programas de crédito rural federais, entre outros.

Entenda o caso

O conflito fundiário envolve a reintegração de posse do perímetro irrigado de Jaguaribe-Apodi, localizado na Chapada do Apodi, na divisa entre o estado do Ceará e o Rio Grande do Norte. Cerca de 150 a 200 famílias ocuparam a região desde o descumprimento do Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) firmado no ano de 2010, em Ação Civil Pública, entre o DNOCS e o MPF, que previa a destinação de 1.000 hectares de terra para moradia e plantio de agricultoras e agricultores familiares de baixa renda.

‌O conflito se agravou em abril de 2010, quando Zé Maria Tomé, liderança comunitária na região do Jaguaribe, foi assassinado em Limoeiro do Norte (CE). A vítima era ameaçada por denunciar o uso indiscriminado de agrotóxicos, o descumprimento da Lei Municipal nº 1.278/2009, que proibia a pulverização aérea de agrotóxicos no município de Limoeiro do Norte, as grilagens de terras no perímetro irrigado Jaguaribe-Apodi e a expulsão de pequenos agricultores do perímetro.

As mais de 60 famílias que moram e vivem da agricultura familiar naquele território estão sob ameaça de expulsão de suas terras pela ação movida pelo DNOCS e a Federação das Associações do Perímetro Irrigado Jaguaribe Apodi (Fapija), movida em 2014. Outra ação movida por particular também ameaça a moradia e subsistência das famílias, pedindo a remoção delas da área do acampamento.

Atuação da DPU

A atuação da DPU no processo começou em 2014, quando foi intimada sobre sentença na ação movida pela Fapija em desfavor do MST. O objetivo era a reintegração de posse em imóvel de propriedade do DNOCS, objeto de esbulho pela Fapija. A DPU entrou com recurso contra a sentença e em 2017 também interpôs agravo de instrumento em defesa dos agricultores e agricultoras, alegando, entre outras questões, que a solução consensual do impasse não foi priorizada, de modo que deveria ser impedida a reintegração de posse nesse contexto.

Em 2014, o próprio DNOCS, em reunião com representantes do MST e dos agricultores familiares ocupantes da área, havia se comprometido a pedir a suspensão da decisão liminar de reintegração de posse. Além disso, a fim de efetivar os compromissos assumidos no TAC, o DNOCS criou a Portaria Ministerial e o Grupo de Trabalho Interministerial para viabilizar um projeto de assentamento dos agricultores familiares. Porém, o TAC nunca foi cumprido e o DNOCS deu andamento à ação de reintegração de posse sem o reassentamento das famílias.

A DPU solicitou, ainda, que fosse extinta a execução da ação por perda superveniente de interesse de agir, diante dos atos adotados pela Administração Pública, no sentido de dar cumprimento ao TAC, com destinação da área em litígio aos atuais acampados. A Defensoria também pediu ao juiz que determinasse uma perícia para identificação da desocupação do Canal do Trabalhador (área do perímetro que se encontrava ocupada, mas que foi desocupada pelas famílias em cumprimento aos acordos) e cadastramento da família para identificação do perfil dos beneficiários do TAC. Porém, os recursos ajuizados pela DPU foram negados.

Com a suspensão dos despejos coletivos forçados durante a pandemia em decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), as famílias permaneceram no território nos últimos anos, porém, com a progressiva retomada de cumprimento das ordens de reintegração de posse coletivas e com a situação já avançada do processo judicial. A DPU, os movimentos sociais e as instituições participantes da reunião buscam uma solução negociada para o conflito. Esta é a terceira reunião sobre o tema, que já foi discutido em encontros em maio e junho.

DCC/GGS
Assessoria de Comunicação
Defensoria Pública da União