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DPU orienta comunidade ameaçada de despejo em Biguaçu (SC) sobre perícias antropológicas
Biguaçu – Ameaçadas de perder casas e ranchos em ações de reintegração de posse, famílias de pescadores artesanais que vivem às margens da rodovia BR-101 em Biguaçu, na Grande Florianópolis, começaram a receber na semana passada a perita judicial que analisará desde quando a região é ocupada por elas e sua relação com a pesca. Esse estudo antropológico é fundamental para confirmar o direito de os moradores permanecerem em suas casas, que estão numa área em que as construções são proibidas por causa da existência da rodovia.
A perícia antropológica ocorre no processo da ação civil pública ajuizada pela DPU em 2017 para que a comunidade seja considerada tradicional e as famílias possam continuar a morar e trabalhar na região da Praia de Baixo ou Bento Francisco.
Em reunião realizada na comunidade no dia 1º de junho, a defensora regional de direitos humanos em Santa Catarina, Mariana Zamprogna, conversou com moradores sobre o início dos trabalhos da perita, que devem durar três meses. Segundo a defensora, havia muitas dúvidas das famílias sobre a realização do novo estudo, depois de já terem sido executadas perícias de engenharia e ambiental. A DPU acompanhará algumas entrevistas feitas pela perita com as famílias.
“Explicamos que o pedido de perícia antropológica foi feito pela própria DPU. O objetivo é confirmar se a comunidade pode ser considerada tradicional. A ação civil pública da Defensoria se baseia no argumento de que, como se trata de uma comunidade tradicional que está na região há mais tempo que a rodovia, deve ser preservada”, relata Zamprogna.
O defensor público federal Rodrigo Tejada também participou da visita à comunidade, que teve a presença da perita judicial. Representantes da associação de moradores, o prefeito municipal de Biguaçu, Salmir da Silva, e a vereadora Salete Cardoso acompanharam a reunião, apoiando a permanência das famílias.
Ocupação antiga
A comunidade está às margens da BR-101. A concessionária da rodovia, Autopista Litoral Sul, alega que os imóveis ficam na faixa de domínio da via e em uma área em que construções não são permitidas, devido à proximidade da pista. A empresa ajuizou ações individuais de reintegração de posse contra os moradores, sem qualquer direito a indenização.
A DPU, além de pedir a permanência das famílias, solicitou à Justiça que essas ações sejam suspensas e julgadas improcedentes ao final do trâmite da ação civil pública. “Hoje a comunidade é composta em grande parte da 2ª ou 3ª gerações de pescadores; o local pode ser considerado de multiplicação da cultura da pesca e subsistência; nesta condição, está protegida por diversos regulamentos internacionais”, argumentou o então defensor regional de direitos humanos em Santa Catarina, João Panitz, na ação.
De acordo com o pedido da DPU, o início da ocupação por pescadores artesanais se deu antes mesmo da obra da rodovia em faixa simples, em 1957. Documentos anexados ao processo, como carteiras de pescador e fotos, fundamentam essa afirmação. Durante a duplicação da rodovia, a partir de 1985, também houve grande esforço das famílias para permanecerem na Praia de Baixo, conforme relatos dos moradores.
A ação pede a adoção de providências que permitam a coexistência da comunidade com o fluxo da rodovia BR-101. Entre as medidas sugeridas à Autopista Litoral Sul e à Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT), rés na ação, estão a redução da velocidade da via naquele trecho, a colocação de placas de sinalização e a correção de declividades.
A fim de comprovar a situação regular das construções na Praia de Baixo, a DPU afirma que a área já é dotada de equipamentos públicos, como sistema de iluminação, fornecimento de água e energia elétrica. Vários imóveis estão inscritos na Secretaria do Patrimônio da União, por estarem localizados em terrenos de Marinha, e seus proprietários pagam Taxa de Ocupação – mais um argumento para comprovar a consolidação da comunidade.
Proteção
Comunidades tradicionais, como pescadores artesanais, indígenas e quilombolas, são “grupos culturalmente diferenciados” que, entre outras características, “ocupam e usam territórios e recursos naturais como condição para sua reprodução cultural, social, religiosa, ancestral e econômica, utilizando conhecimentos, inovações e práticas gerados e transmitidos pela tradição”. A definição está no Decreto 6.040/2007, da Presidência da República, que institui a Política Nacional de Desenvolvimento Sustentável dos Povos e Comunidades Tradicionais. Esses grupos são protegidos por dispositivos legais nacionais e internacionais, a exemplo dos artigos 215 e 216 da Constituição Federal, da Convenção 169 da Organização Mundial do Trabalho e do próprio Decreto 6.040/2007.
Assessoria de Comunicação Social
Defensoria Pública da União