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Dia Internacional dos Povos Indígenas: do marco temporal aos desafios diários das comunidades

Brasília – O último ano foi bastante difícil para os povos originários do Brasil. Da busca pela dignidade ao direito à cultura e ao estilo de vida, em todo o país, a questão indígena é atravessada pela demarcação das terras. Originalmente ocupadas pelos povos que aqui viviam muito antes de 1500, elas estão no centro dos debates deste 9 de agosto, quando se comemora o Dia Internacional dos Povos Indígenas.

A data foi criada para marcar o dia da primeira reunião, em 1982, do Grupo de Trabalho da Organização das Nações Unidas (ONU) sobre Populações Indígenas, da Subcomissão de Promoção e Proteção dos Direitos Humanos. Foi um reconhecimento do direito à voz e à representação, bem como das instituições próprias e do desenvolvimento econômico dos povos indígenas.

Quando há o reconhecimento e as demarcações, os povos indígenas enfrentam ainda problemas relacionados às ocupações de posseiros, a invasões e à extração ilegal de recursos vegetais e minerais, como ocorre no garimpo ilegal e na atividade das madeireiras. Além disso, essas populações também sofrem com as condições mínimas de direito à educação, à saúde e à própria logística dos territórios.

Insegurança e Violência

Nesta quarta-feira (9), a Defensoria Pública da União emitiu uma Nota Técnica, por meio do Grupo de Trabalho Comunidades Indígenas (GTCI), recomendando o ingresso da DPU como amicus curiae (amigo da corte) na Ação de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) nº 1059, movida pela Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB) contra o estado de Mato Grosso do Sul. Na ação, a APIB argumenta que as operações policiais configuram um quadro crônico de violência contra os povos indígenas Guarani e Kaiowá, “perpetuando um projeto colonial que teve início ainda no século XIX”, conforme consta no documento.

A ADPF tem inúmeros relatos das operações policiais violentas realizadas contra indígenas no estado, que é acusado de possuir uma conduta sistemática anti-indígena. A invasão das terras indígenas Buriti e Tey Kue de Caarapó, o assassinato de indígenas, as buscas, apreensões e desocupações forçadas, todas sem autorização judicial, são parte das constatações apresentadas na ação, que pede o fim das violações à segurança e ao território.

A Nota Técnica da DPU elenca uma série de princípios constitucionais que estão sendo desrespeitados no Mato Grosso do Sul, além das violações aos direitos humanos e a dispositivos internacionais, como a Declaração das Nações Unidas sobre os Povos Indígenas, a Convenção Americana sobre Direitos Humanos, a Declaração Americana dos Direitos dos Povos Indígenas e a Convenção nº 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT).

“Os argumentos apresentados demonstram que a política de segurança pública do Mato Grosso do Sul é orientada por um forte viés anti-indígena, podendo ser considerada como parte de um projeto de extermínio contra essa população. A sistemática atuação violenta sem fundamentação e autorização judicial caracteriza a polícia militar sul mato-grossense como uma milícia particular dos latifundiários do estado”, denuncia a nota.

Leia aqui a Nota Técnica na íntegra.

Serviços Básicos

Garantir a segurança jurídica do território é o primeiro passo, mas ela deve vir acompanhada pelos serviços básicos. Saúde, educação ou o serviço dos Correios muitas vezes não alcançam as comunidades indígenas, que se veem isoladas, aumentando sua vulnerabilidade. Em outros casos, como o ocorrido em Altamira (PA), a mudança total do ecossistema obriga os indígenas a mudarem seu estilo de vida e a forma como se relacionam com a natureza.

A Terra Indígena Paquiçamba foi a maior afetada pela construção da Usina Hidrelétrica de Belo Monte. Com um território de 4 mil hectares, exatamente no ponto da volta grande do Rio Xingu, o estilo de vida da comunidade foi totalmente modificado. O barco, que era o transporte comum dos indígenas que se dirigiam até Altamira, agora não pode mais ser usado. Estradas de terra foram abertas até o território. No local onde o Xingu fazia a curva rumo ao Norte, só é possível o transporte pelo rio em algumas épocas do ano.

Os indígenas da etnia Juruna sofrem com a falta de serviços básicos de saúde e com a espera pelo recebimento dos recursos que foram pactuados para a licença de operação da hidrelétrica. Neste ano, a Defensoria Pública da União cobrou ao Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e Recursos Renováveis (Ibama) e a Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai), por meio de documentos, o cumprimento dos requisitos do plano básico ambiental – componente indígena (PBA-CI) para a Terra Indígena Paquiçamba.

Nesse mesmo caminho, os Mebêngôkre/Kayapó da Terra Indígena Capoto Jarina, no Mato Grosso, lutam para manter a administração da balsa que atravessa o Rio Xingu. O transporte é operado legalmente pelos indígenas desde a década de 80, representando importante fonte de renda para o território. Um termo de ajustamento de conduta (TAC) foi assinado entre a DPU, o Ministério Público Federal (MPF) e o Governo do Estado do Mato Grosso, para trazer segurança jurídica à operação do serviço, que foi alvo de processo judicial em 2021.

A DPU acompanha o andamento do acordo realizado no ano passado, apenas faltando alguns detalhes para o total cumprimento do TAC assinado pelas instituições.

Marco Temporal

Na disputa pelas demarcações, um projeto de lei que trata do marco temporal para terras indígenas voltou a ser debatido. O projeto fixa que, para as terras serem consideradas ocupadas tradicionalmente, deve haver comprovação que elas já eram habitadas em caráter permanente na data da promulgação da Constituição de 1988. O projeto foi aprovado na Câmara dos Deputados no dia 30 de maio de 2023, mas enfrenta oposição de indígenas, ativistas e ambientalista. Atualmente, aguarda os trâmites do Senado Federal sob o número 2903/2023, e a DPU segue acompanhando a pauta.

DCC/ACAG
Assessoria de Comunicação
Defensoria Pública da União