DPU – Direitos Humanos

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Visitas a quilombolas do Vale do Ribeira (SP) expõem falta de serviços e dignidade

São Paulo – Por uma semana, a Defensoria Pública da União (DPU) esteve em visitas às comunidades quilombolas da região do Vale do Ribeira, interior de São Paulo. No total, foram visitados oito territórios, localizados nos municípios de Iporanga, Eldorado e Itaoca, com o objetivo de constatar a situação de vida das populações locais e manter acompanhamento próximo dos processos abertos na DPU sobre as atividades realizadas pelo poder público nas comunidades.

A primeira visita foi à Equipe de Articulação e Assessoria à Comunidades Negras (EAACONE), que articulou com as associações dos territórios as visitas realizadas pela DPU. A EAACONE presta serviço de suma importância na observação das inúmeras violações de Direitos Humanos que ocorrem na região, apoiada pelo Fundo Brasil Direitos Humanos (FBDH). Também participou da reunião a assessoria jurídica do Instituto Irmãs Santa Cruz e assessorias das comunidades.

Uma das principais questões levantadas nas visitas aos quilombos é a titulação das terras e a desintrusão, que é a remoção de pessoas que não são da comunidade tradicional das terras que são de direito dos quilombolas. As comunidades Pedro Cubas de Cima, Ivaporunduva e Cangume sofrem com invasões de áreas de suma importância para sua subsistência, e não possuem recursos ou meios para realizarem a liberação dos territórios. A titulação é um problema em quase todas as comunidades, que reclamam não ter acesso aos processos ou o andamento nos órgãos de regulação.

A comunidade André Lopes, reconhecida em 2001 e ainda não titulada, tem território sobreposto pelo Parque Estadual Cavernas do Diabo, criado sete anos após o reconhecimento da comunidade, reclama que até hoje não há a aplicação de um protocolo que permita a correta exploração turística do território. Os quilombolas não estão sendo consultados sobre as atividades do parque, além de estarem sendo obrigados a renunciar parte importante de seu território, próximo da estrada de acesso.

Em Bombas, localizado no município de Iporanga, a equipe encontrou uma das piores situações. A comunidade está 10km a pé da entrada da Reserva Betary, gerida pelo Instituto de Pesquisas da Biodiversidade. O péssimo estado da trilha, coberta por lama até os joelhos em diversos trechos, impossibilita o transporte de recursos básicos para a população, que não tem acesso à saúde e educação. Os quilombolas disseram ser necessária a construção de uma estrada que permita o acesso ao local, além da construção de um posto de saúde com a distribuição de medicamentos, o que não existe no momento.

“As pessoas que ali residem precisam interagir com as cidades, tanto para acessar os serviços públicos básicos de saúde e educação, quanto para desenvolver suas atividades econômicas, predominantemente baseadas na agricultura, pesca e artesanatos”, comentou o defensor regional de direitos humanos de São Paulo, Guillermo Rojas de Cerqueira César, que realizou a visitação. A situação é agravada ainda pelo fato de que o Instituto de Terras do Estado de São Paulo (ITESP), responsável pelas titulações no Estado, não visitar o local há mais de seis anos.

Os Caboclos do Ribeirão dos Camargos, outra comunidade tradicional localizada na região, tem seu território sobreposto ao Parque Estadual Turístico do Alto Ribeira (PETAR), onde não lhes é permitida a exploração do solo com roças tradicionais ou atividades turísticas. A comunidade busca desde 2012 a transformação do território em Reserva de Desenvolvimento Sustentável (RDS). Diversas famílias também estão isoladas, pois o projeto da estrada Morro de Chumbo se encontra parado há quatro anos pelas autoridades.

Educação

O efetivo direito a educação de qualidade atinge quase todas as comunidades visitadas. A maioria dos territórios quilombolas não possui escola instalada e, quando possui, está em péssimo estado de conservação ou não há professores para todas as disciplinas. Na comunidade Porto Velho, a escola disponibilizada fora do território tem apenas um professor dando conta de alunos de diversas séries. A prefeitura dá transporte aos alunos até metade do caminho, fazendo com que algumas crianças nem possam estudar por não terem acesso fácil a estrada.

As comunidades também reclamam da falta de acesso ao ensino superior e a cursos técnicos. A comunidade Cangume reclama da distância do polo universitário mais próximo. A DPU irá oficiar os Ministérios da Educação, Igualdade Racial e universidades de São Paulo para tentar buscar uma solução.

Apagão

A DPU também encontrou comunidades com falta de energia elétrica. O quilombo Praia Grande, que é acessível somente por meio de barco a motor custeado pela própria população, sem apoio da prefeitura de Iporanga, pede que a companhia Elektro amplie o fornecimento de eletricidade. Há constantes apagões na região pela insuficiência das placas solares e da inexistência de cabeamento, que poderia ser realizado pela Copel.

A comunidade também requere que a prefeitura restabeleça o serviço de travessia do rio por meio de barqueiro. Atualmente, as pessoas tentam atravessar o rio a nado, caso não tenham recursos para custear a travessia. Outro pedido da comunidade seria a restauração da estrada existente, atualmente intransitável.

Próximos Passos

Após as reuniões, a DPU vai buscar informações junto aos órgãos competentes para saber os andamentos dos processos de titulação das comunidades. Com exceção da comunidade de Ivaporunduva, todas as outras ainda não receberam as titulações que fazem jus, apesar de várias já serem reconhecidas como remanescentes de quilombos. Este é o primeiro e mais importante passo.

“Somente após a titulação do território que a comunidade passa a dispor dos meios necessários para o desenvolvimento social e econômico, como, por exemplo, por meio do ecoturismo, que vai proporcionar melhor qualidade de vida aos habitantes”, comentou Guillermo Rojas. A DPU passará a acompanhar os processos que hoje tramitam junto ao ITESP e o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), auxiliando as comunidades para que seja finalizado.

Convenção 169 da OIT

A Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT) é um tratado internacional adotado desde 1989 que garante às comunidades tradicionais e indígenas a consulta e participação na tomada de decisões que impactam suas vidas. O texto da Convenção se baseia no respeito às culturas e os modos de vida destes povos, reconhece os direitos deles à terra e aos recursos naturais e de definir suas próprias prioridades para o desenvolvimento de suas terras.

DCC/GGS
Assessoria de Comunicação
Defensoria Pública da União