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Auxílio Brasil: empréstimo consignado pode gerar superendividamento da população
Brasília – O Comitê Temático Especializado Renda Básica Cidadã e o Grupo de Trabalho Garantia à Segurança Alimentar e Nutricional da Defensoria Pública da União (DPU) publica nota técnica apontando problemas sociais, econômicos, administrativos e financeiros que poderão ser gerados com o comprometimento do Auxílio Brasil com empréstimo consignado. O documento destaca ainda as violações constitucionais relacionadas à medida provisória que cria o benefício.
A Medida Provisória nº 1.106/2022 possibilita a contratação de empréstimo consignado atrelado a programas de transferência de renda, como o Auxílio Brasil e o Benefício de Prestação Continuada (BPC), com um limite de até 40% do valor recebido. A Câmara dos Deputados aprovou texto-base, e o Senado Federal aprovou o Projeto de Lei de Conversão (PLV) nº 18, de 2022, proveniente da medida provisória. O texto atualmente aguarda a sanção presidencial para sua implementação no cenário nacional.
A nota técnica alerta para os problemas que poderão ser provocados com a sanção da nova lei. De acordo com o texto, a autorização de empréstimo consignado, com possibilidade de comprometimento de até 40% do valor mensal dos benefícios de programas federais de transferência de renda, representa:
- Risco de superendividamento das famílias em pobreza e extrema pobreza, violando o mínimo existencial e perpetuando parcela da população no ciclo vicioso da pobreza, especialmente considerando a ausência de limites de juro e regulamentação dos empréstimos;
- Risco à segurança alimentar das famílias em pobreza e extrema pobreza, considerando que o valor – já aquém do necessário – pode ser comprometido em até quarenta por cento, sem representar acesso duradouro à alimentação adequada;
- Desvio de finalidade dos programas de transferência de renda, na medida em que até quarenta por cento do valor dos benefícios poderão ser descontados diretamente na fonte e encaminhados a instituições financeiras, sem que haja benefício duradouro às famílias em pobreza e extrema pobreza;
- A retroalimentação do sistema financeiro, na medida em que parte dos valores dos empréstimos serão destinados para quitação de dívidas financeiras já em curso, especialmente daquelas decorrentes de cartão de crédito;
- A ampla possibilidade de fraudes, como já ocorre nas consignações em benefícios assistenciais e previdenciários, comprometendo, ainda mais, as famílias beneficiadas pelos programas de transferência de renda;
- O retrocesso da política de transferência de renda, por comprometer, sem benefício real à população, a renda básica destinada a assegurar o mínimo existencial.
Recomendações
O documento também apresenta alternativas para capitalizar a população. O comitê e o grupo de trabalho recomendam o fornecimento de recursos à população destinatária dos programas de transferência de renda por meio de um modelo público de antecipação do valor do benefício, sem a incidência de juros e de correção monetária, tal qual já realizado pelo Poder Público em outras hipóteses.
Além disso, foram recomendadas a disponibilização de microcrédito à parcela mais vulnerabilizada da população, com incidência limitada de juros e o não desvio do orçamento público da assistência social – ainda que indiretamente – a instituições financeiras. A retomada do debate colegiado de medidas dessa natureza, com a participação da sociedade civil, a exemplo do extinto Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional, também está entre as recomendações.
Por fim, a nota técnica “propõe que, como política de Estado, seja realizado o veto à Medida Provisória n° 1.106/2022, aprovada na forma de Projeto de Lei de Conversão, uma vez que a realização de empréstimos e financiamentos mediante crédito consignado em programas de transferência de renda, tais como o Auxílio Brasil, mostra-se destoada do legítimo interesse público, na medida em que não promove a consecução da finalidade pública prevista na norma constitucional. Em caso de sanção e transformação do texto em lei ordinária, desde já, aponta-se pela necessidade de medidas de correção posteriores pelo Poder Legislativo ou pelo Poder Judiciário”.
Saiba mais
Se sancionada, a nova lei permitirá que o beneficiário do Auxílio Brasil faça empréstimo consignado no banco, usando até 40% do valor do benefício. A nota trata de toda a problemática relacionada à medida, que tende a gerar um superendividamento da população. O valor de R$ 600 do Auxílio Brasil não é suficiente para as necessidades básicas das pessoas.
Há, então, grandes possibilidades de que elas usem este empréstimo consignado justamente para comprar comida e itens básicos de sobrevivência. Por terem comprometido 40% do benefício, que serão usados para pagar a dívida, passarão a receber uma parcela ainda menor do que os R$ 600. Enquanto isso, bancos não terão qualquer tipo de regulamentação para a cobrança de juros, por exemplo.
A Nota Técnica conclui que tal Medida Provisória beneficia muito mais bancos do que pessoas e apresenta como alternativa para o repasse de recursos às famílias em pobreza e extrema pobreza instrumentos como o microcrédito ou empréstimo direto com o Governo, por meio do adiantamento das parcelas de benefícios do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), FGTS ou do próprio Auxílio Brasil, sem a incidência de juros, algo que já foi feito anteriormente durante a pandemia.
Confira aqui a nota técnica completa.
Assessoria de Comunicação Social
Defensoria Pública da União