DPU – Direitos Humanos

Grupos de trabalho da DPU emitem nota relativa a PL sobre terras da União

Brasília – Por meio de Nota Técnica, os grupos de trabalho da Defensoria Pública da União (DPU) – Comunidades Indígenas, Comunidades Tradicionais e Moradia e Conflitos Fundiários – expuseram considerações técnicas e jurídicas sobre o Projeto de Lei nº 2.633/2020, que trata de alterações na lei sobre a regularização fundiária das ocupações de terras situadas em áreas da União, no âmbito da Amazônia Legal, – a Lei nº 11.952/2009. A área é composta pelas unidades da federação: Acre, Amapá, Amazonas, Pará, Rondônia, Roraima, Tocantins, Mato Grosso e Maranhão. O PL está em tramitação em regime de urgência na Câmara dos Deputados.


De acordo com a nota, um dos problemas é que não há dados públicos sistematizados, por exemplo, que indiquem avanços no processo de regularização a partir de 2017, quando a legislação foi alterada pela primeira vez. Desta forma, nova mudança do marco legal, sem dados públicos de monitoramento dos processos em curso, é uma modificação de rumo sem definição prévia e precisa dos acertos e erros das medidas anteriores. “No mínimo, limita-se a participação da sociedade nesse debate, que deve ser uma participação informada”, destacam os defensores públicos federais que assinam o documento.


Além da falta de dados públicos, o próprio momento da avaliação é problemático, pois o Brasil enfrenta uma grave crise em saúde, com a adoção de medidas de restrição de circulação e de manifestação, de forma que o debate público sobre a proposta está extremamente prejudicado. “Neste momento, parcelas da sociedade, favoráveis ou contrárias à modificação normativa, estão impedidas de realizar atos presenciais de apoio ou repúdio ao debate parlamentar”, ressalta a nota.


Além disso, pondera-se que eventual apreciação do PL pelo Congresso Nacional, no atual momento, não coaduna com o que dispõe o Ato Conjunto nº 2 das Mesas da Câmara dos Deputados e do Senado Federal, segundo o qual somente poderão ser pautadas as matérias urgentes ou relacionadas à Covid-19.


Os defensores federais apontam ainda que devido à deficiência na fundamentação legislativa, à insuficiência de dados sistematizados e públicos e aos impedimentos à ampla participação social no debate parlamentar em razão da crise em saúde e das medidas de restrição de circulação, o debate sobre o PL nº 2.633/2020 tem significativo déficit democrático. Isso porque a atenção prioritária dos órgãos públicos e da sociedade civil está voltada à preservação de vidas e da saúde coletiva e à mitigação dos efeitos socioeconômicos negativos sobre os mais vulneráveis.


Histórico das discussões


Conforme o documento, a regularização fundiária é uma política pública infraconstitucional pela qual se concede título fundiário a pessoas que ocupam áreas da União e lhes conferem função social pelo trabalho e pela moradia.

Na redação original, a Lei de 2009 prevê a regularização de ocupações sobre até 15 módulos fiscais de terras da União, desde que não superiores a 1.500ha. A norma se estende a brasileiros natos e naturalizados, que não sejam proprietários de outro imóvel rural, pratiquem cultura efetiva, não tenham sido beneficiadas por programa de reforma agrária ou regularização fundiária rural anteriormente e comprovem o exercício de ocupação e exploração direta, mansa e pacífica, por si ou por seus sucessores, anterior a 1º de dezembro de 2004.


Também prevê que as terras ocupadas por comunidades quilombolas ou tradicionais que façam uso coletivo da área serão regularizadas de acordo com as normas específicas, aplicando-se lhes, no que couber, os dispositivos dessa lei. A norma estabelece ainda que os requisitos para a regularização fundiária dos imóveis de até quatro módulos fiscais serão averiguados por meio de declaração do ocupante, dispensada a vistoria prévia.


A Lei nº 11.952/2009 foi alterada pela Lei nº 13.456/2017 – conversão da Medida Provisória nº 759/2016 –, que ampliou a área de ocupação passível de ser regularizada para até 2.500ha e passou a admitir que a ocupação e exploração direta fossem anterior a 22 de julho de 2008, ao estender a regularização para ocupações mais recentes.


Em 2019, o Supremo Tribunal Federal publicou o acórdão da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADIN) 4269, em que determina que a aplicação do art. 4º, §2º, da Lei nº 11.952/2009 não pode implicar a regularização fundiária de terras ocupadas por quilombolas e outras comunidades tradicionais em nome de terceiros ou de modo a descaracterizar o modo de apropriação da terra por esses grupos; (b) a aplicação do art. 13 não pode implicar a desnecessidade de fiscalização dos imóveis rurais de até quatro módulos fiscais, ainda que por meio remoto.

Também em 2019, foi editada a Medida Provisória (MP) nº 910, para admitir que a ocupação e a exploração direta passíveis de regularização fossem anterior a 5 de maio de 2014, ampliando a regularização para ocupações mais recentes. Estabeleceu ainda que as terras ocupadas por comunidades quilombolas ou tradicionais que façam uso coletivo da área serão regularizadas de acordo com normas específicas. Por fim, estabeleceu que os requisitos para a regularização fundiária de imóveis de até quinze módulos fiscais serão averiguados por meio de declaração do ocupante. Desta forma, autorizou que a comprovação da exploração anterior a 5 de maio de 2014 seja feita por sensoriamento remoto, e exigindo vistoria previa nas hipóteses que especifica.

A Nota Técnica destaca também que, apesar de a MP 910 ter caducado, o objeto foi parcialmente incorporado no PL nº 2633/2020. Um dos pontos é a nova redação ao art. 4º, §2º: “As terras ocupadas por comunidades quilombolas ou tradicionais que façam uso coletivo da área serão regularizadas de acordo com normas específicas, vedada a regularização fundiária em nome de terceiros ou de modo a descaracterizar o modo de apropriação da terra por esses grupos”. Outro destaque é a nova versão do art. 13, ao ampliar para seis módulos fiscais o tamanho do imóvel cuja regularização pode dispensar vistoria prévia. Contudo, manteve hipóteses de vistoria previa obrigatória, nos termos da MP 910/2019, e manteve a exigência de ocupação anterior a 22 de julho de 2008.

Confira a íntegra da Nota Técnica

Assessoria de Comunicação Social
Defensoria Pública da União