Brasília – A Defensoria Pública da União (DPU) alertou que o empréstimo consignado do Auxílio Brasil poderia levar famílias em situação de pobreza e extrema pobreza ao superendividamento e à insegurança alimentar, além de ser um retrocesso na política de transferência de renda no Brasil. Em notas técnicas, relatórios e petições, a instituição se manifestou pela impossibilidade de consignação do valor do benefício, que teve novas concessões suspensas pela Caixa Econômica Federal em 12 de janeiro deste ano.
A primeira nota técnica do Comitê Renda Básica Cidadã da DPU foi publicada em 6 de maio de 2022. Após apresentar uma análise acerca da legislação vigente, o documento concluiu que a Medida Provisória nº 1.106 de 2022, editada pelo então presidente da República Jair Bolsonaro, não previa as consequências de eventual desligamento do programa Auxílio Brasil.
De acordo com a nota, a medida provisória contribuía para um forte processo de financeirização da política social que prejudicava os direitos dos cidadãos ao garantir pagamentos ao sistema financeiro por meio de consignações. “Dada à sua natureza existencial, os valores da Renda Básica de Cidadania devem ser isentos de penhora e de cooptação por outros atores, que não sejam os beneficiados”, avaliou a DPU na ocasião.
A DPU também emitiu uma nota conjunta elaborada pelo Comitê de Renda Básica Cidadã e pelo Grupo de Trabalho (GT) Garantia à Segurança Alimentar e Nutricional. No documento, a equipe chamava atenção para o fato de que 38,2% das famílias brasileiras já se encontravam em situação de endividamento.
Na análise da DPU, os empréstimos consignados em benefícios sociais poderiam agravar um problema existente na realidade brasileira atual, o superendividamento. No texto da nota, consta que “a mera concessão de possibilidade de financiamento, alienada de outras políticas públicas, não altera a situação econômica das camadas mais vulnerabilizadas e amplia o risco de superendividamento, o que a longo prazo, implica no aumento da pobreza, da situação de miséria e no crescimento da população em situação de rua”. Assim, a DPU apontou outras medidas, menos gravosas à população vulnerável, para a concessão de recursos financeiros.
Relatório para o governo de transição
Os riscos do empréstimo consignado do Auxílio Brasil também fizeram parte de um relatório com um diagnóstico sobre políticas públicas para a população mais vulnerável que a DPU encaminhou para a equipe de transição do governo federal. No texto, a instituição recomendou:
- A revogação do Decreto nº 11.170/2022, interrompendo-se imediatamente a concessão de empréstimos consignados a beneficiários de programas de transferência de renda;
- A disponibilização de microcrédito para essa parcela da população com incidência limitada de juros, ou a adoção de um modelo público de antecipação de valores do benefício, sem a incidência de juros ou correção monetária;
- A alteração da Portaria MC nº 816/2022 para diminuir o limite de juros em empréstimos consignados do Auxílio Brasil (BolsaFamília).
Alerta chegou ao STF
A DPU protocolou pedido para ingressar como amicus curiae (amigo da corte) em ação que tratou da ampliação da margem de empréstimo consignado, a ser julgada pelo plenário do Supremo Tribunal Federal (STF).
“As alterações legislativas mencionadas possuem como público-alvo, em sua maioria, pessoas hipossuficientes, as quais, não raro, dependem da renda recebida pelos programas sociais para garantir a sua própria subsistência”, apontou a DPU. Argumentou ainda que, nesse caso, “a atuação da Defensoria Pública da União se faz imperiosa, uma vez que a Lei nº 14.431/22 incidirá sobre parcela vulnerável da população, como, por exemplo, aposentados e pessoas em situação de extrema pobreza”.
O que era o empréstimo consignado
A lei ampliou a margem do crédito consignado dos empregados regidos pela Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) e dos beneficiários do Regime Geral da Previdência Social, além de ter autorizado a contratação de empréstimo para beneficiários de programas sociais do governo federal, como o Auxílio Brasil e o Benefício de Prestação Continuada (BPC/LOAS).
A Caixa Econômica informa que “novas contratações do empréstimo consignado Auxílio Brasil estão suspensas. As parcelas dos contratos realizados anteriormente são debitadas automaticamente do benefício, antes do benefício ser depositado em sua conta”.
Comitê Renda Básica Cidadã
O Comitê Temático Especializado Renda Básica Cidadã (RBC) foi criado, em 30 de abril de 2021, com o objetivo de planejar, definir, coordenar e promover ações estratégicas da Defensoria Pública da União voltadas à implementação da Renda Básica da Cidadania, instituída conforme Lei nº 10.835, de 08 de janeiro de 2004.
Com essa finalidade, o Comitê promove ações, judiciais e extrajudiciais, perante instituições, Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário, em permanente diálogo e com contribuições recíprocas com a sociedade civil.
Assessoria de Comunicação Social
Defensoria Pública da União